Quando me mudei do Brasil para a Inglaterra em 2013, tinha a ideia fixa de que todo autista deveria frequentar a escola regular. O engraçado é que não sei de onde isso veio, já que a relação do Theo com a escola regular teve vida curta: menos de um ano. Dos dois aos dois anos e meio, ele frequentou uma escola bilíngue – onde notaram seus sintomas de autismo – e, após o diagnóstico, uma escola regular normal por mais seis meses.
Após este primeiro ano, e já notando as dificuldades que minhas amigas com filhos autistas em fase de alfabetização estavam tendo, decidimos mudar o Theo para uma escola que fazia um trabalho à parte usando ABA. Não posso dizer que era uma “escola regular”.
Enfim, chegamos a Londres. Visitei algumas escolas que trabalhavam com crianças autistas, e o que percebi, logo de cara, foi que a inclusão na sala regular só acontecia mesmo com autistas mais leves e verbais. Quando visitamos, por fim, a escola onde queríamos que ele estudasse, a diretora deixou claro, após conhecê-lo, que ele não acompanharia bem uma classe regular, e sugeriu o esquema no qual estamos até hoje: a classe especial dentro da escola regular.
Como isso funcionava em Londres: Theo passou por uma avaliação criteriosa com vários profissionais (fono, psicólogo, pedagoga), e eles emitiram um relatório detalhado explicando por que ele precisava de suporte extra e, para isso, deveria ser matriculado na classe especial. Em outras palavras: Theo ganhou o direito de frequentar a sala especial, onde teria mais suporte.
As aulas mais gerais, como música, artes e educação física, ele fazia com as crianças das turmas regulares da mesma idade. A parte da aprendizagem (como matemática e pré alfabetização), ele fazia na sala especial, com material pedagógico adaptado, pessoas especializadas em educação especial que sabiam desde TEACCH e PECs até princípios de análise do comportamento.
Na mesma sala, Theo recebia a fono duas vezes por semana, tinha musicoterapia e até equoterapia. Ficava na escola das 8:15 às 15:15.
Suécia
Chegando na Suécia, o processo foi diferente. Como ele já tinha o diagnóstico formal e detalhado da Inglaterra, não foi preciso passar por este processo novamente. Mas ele passou por uma avaliação longa com uma psicóloga para determinar se ele tinha déficit cognitivo. Acontece que, aqui na Suécia, se a criança tem déficit cognitivo, ela deve frequentar a sala especial dentro da escola regular ou a escola especial.
Não vou entrar no mérito da questão do déficit cognitivo e nem se concordo com a regra da Suécia. Há várias controvérsias sobre a efetividade de se medir o QI de uma criança autista não verbal usando métodos convencionais. Eu mesma duvido um bocado. Mas, trocando em miúdos, o fato é que tivemos uma experiência muito boa em Londres com a sala especial, e eu queria que Theo continuasse no mesmo esquema. Então, quando o resultado da avaliação deu que ele tinha o tal déficit cognitivo, olhei pelo lado positivo: ele vai ter mais suporte, assim como tinha em Londres.
E continuamos, então, no mesmo esquema em Estocolmo: uma sala especial dentro de uma escola regular, com um professor por aluno e suporte individualizado. A maior diferença é que esta escola foca em ABA como metodologia de ensino. E, com todos os prós e contras, é uma metodologia à qual Theo se adequou muito bem desde pequeno. Theo está sendo alfabetizado assim, e em sueco!
Aqui tem um vídeo do Theo recebendo ABA na escola com o “tio Mark”, seu professor querido:
Tanto em Londres quanto em Estocolmo, também há as escolas especiais, desligadas da escola regular. Eu preferi manter o Theo neste esquema de sala especial dentro da escola regular porque ele ainda continua convivendo com as crianças típicas em alguns momentos do dia.
Minhas conclusões
É bom deixar claro que são MINHAS. Porque vieram da minha vivência, da minha experiência, e do meu conhecimento sobre os pontos fortes e os que necessitam de desenvolvimento no meu filho.
Não sou mais a pessoa radical que era, há uns anos atrás, com relação à inclusão. Acredito que ela pode beneficiar muitas crianças autistas ou com outras deficiências, mas cada caso é único, cada criança tem suas necessidades específicas e nem todas vão aprender melhor desta forma.
Para o meu filho, eu não tenho dúvidas de que o melhor esquema foi o da sala especial na escola regular. Não consigo imaginar o Theo dentro de uma sala regular, mesmo com uma mediadora cem porcento do tempo. Theo tem a atenção muito curta (apesar de já ter melhorado), tem suas necessidades sensoriais, e não conseguiria acompanhar uma classe regular. Não seria alfabetizado pela mesma metodologia que as crianças típicas o são. Não aprenderia os números da mesma forma.
Theo aprende de outra forma, e somos nós que temos que nos adequar a isso, e não forçá-lo a ficar onde não aprenderia.
Ele continua tendo o DIREITO de frequentar a classe regular assim como todas as crianças, mas isso não significa que esta opção seja a melhor para o caso dele.
Decidimos respeitar o modo como o nosso filho aprende. Decidimos que isso é mais importante. E, acima de tudo, ele vai para a escola feliz. Os aprendizados estão aparecendo no ritmo dele. Então, é sinal de que está funcionando!
E agora?
Se você tem a possibilidade de escolher entre a escola regular ou especial, preste atenção no seu filho. Converse com os profissionais que cuidam dele (a psicóloga, a fono) e tente entender o que é o ideal para ele. Ele está realmente aprendendo na escola regular? Está sendo uma experiência positiva? Ele está feliz? São muitas coisas para se levar em consideração e a decisão é totalmente pessoal.
Quer tentar a escola regular? Então, verifique se a escola é aberta ao diálogo, se já sabe como auxiliar seu filho da melhor forma ou, se não souber, se está aberta e deixar que as terapeutas dele deem algumas dicas para as professoras, se estão dispostos a procurar qualificação. Simplesmente colocar uma criança autista na sala regular e esperar que ela aprenda como os outros não é inclusão. Deixá-la na sala regular “encostada” em um canto sem participar das atividades não é inclusão. Inclusão de verdade é entender que todas as crianças são iguais em direitos, mas que suas características particulares precisam ser respeitadas para que possam atingir todo o seu potencial.
Está de olho em uma escola especial? Então, avalie se o pessoal é treinado em educação especial, se têm metodologias adequadas de ensino e, acima de tudo, se ENSINAM. Escola especial não pode ser “estacionamento de crianças com deficiência”, como meu marido costuma falar. Ela tem que ensinar!
E, para encerrar, eu acredito que fazer classes especiais dentro das escolas públicas regulares seria uma ótima opção. É muito mais barato para o Estado do que construir escolas especiais. É questão de adequação de espaço e treinamento de pessoal. E o mais legal: além de terem todo o suporte extra que necessitam, essas crianças autistas ou com outras deficiências (que não se adaptaram à escola regular) podem continuar convivendo com as crianças típicas.
P.S: sei que a situação no Brasil não se compara, mas o objetivo do post foi tirar um pouco do peso dos ombros das mães que optam pela escola especial. Ela pode ser, sim, uma escolha boa em alguns casos. Também quis mostrar o que funciona por aqui para dar um norte a quem pretende cobrar os políticos que elegeu na última eleição. É assim que se mudam as coisas!
Imagem: Shutterstock
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