E, depois de 3 anos morando no exterior, estamos de volta ao Brasil. No total, um ano em Londres e dois em Estocolmo, na Suécia. Uma vida completamente diferente da que levávamos antes. Muito crescimento, muito aprendizado. Morar em um lugar com a cultura completamente diferente da sua te faz desenvolver melhor o “sevirômetro”. Viver onde alguns serviços – como o de jardineiro, empregada doméstica, pedreiro e encanador – são escassos e extremamente caros, você aprende a por a mão na massa e fazer você mesmo, nem que seja com base em tutoriais encontrados no youtube. Aprende, também, que antibiótico é último caso. E que hospital é lugar de gente doente de verdade. Às duras penas, entendi que dois ou três dias de febre são ok, e que devemos esperar para ter certeza de que o corpo não vai reagir sozinho – e desenvolver, a partir daí, anticorpos. Aprende a usar de verdade o serviço de transporte público, pois as cidades em que moramos não fazem a menor questão de facilitar ou baratear a vida de quem insiste em andar de carro. Se tem uma coisa que eu aprendi vivendo fora é que o seu relacionamento com esta nova situação é como qualquer outro relacionamento: com um namorado, com um emprego novo, com uma nova atividade física. Estamos falando aqui de 3 fases:
A paixão ou encantamento: tudo é lindo, tudo é perfeito, essa cidade/pessoa/emprego é o “must” e não sei como eu aguentava a cidade/pessoa/emprego anterior.
A realidade: você começa, finalmente, a ver os defeitos da cidade/pessoa/emprego. Você vê a situação como ela é, desnuda, fazendo xixi de porta aberta, com suas vantagens e desvantagens.
A decisão: aqui é quando você resolve, olhando friamente os prós e contras, se vale a pena continuar com aquela relação.
Coincidência ou não, chegamos no ponto 3 justamente no terceiro ano de vida morando fora. E, no nosso caso, os contras pesaram mais que os prós e decidimos voltar.
E quais foram os contras?
Sim, morar na Europa foi uma delícia por um bom tempo. Viajei, conheci lugares – afinal, lá é tudo muito perto – e aproveitei muito a sensação de liberdade que a segurança proporciona. Mas algumas coisas começaram a pesar muito. Para os curiosos, aqui vai uma singela listinha:
Não achamos, pelo menos na Suécia, médicos e outros profissionais realmente bons no sistema público de saúde. E é aquela coisa: é este e acabou, não é você que escolhe. Theo tinha uma psiquiatra designada que considerei fraca. A fono, idem. E não tinha lá muita coisa que eu pudesse fazer, afinal, o país está passando por muitos cortes de orçamento. Só pra se ter uma ideia, eu estava em processo para diagnóstico oficial do meu TDAH há um ano, e saí de lá sem ele. A fila para atendimento na psiquiatria/psicologia era imensa.
Éramos muito sozinhos. Os suecos não são lá super amigáveis com desconhecidos. Conhecemos alguns brasileiros muito legais, com quem mantemos contato. Mas amigos mesmo, daqueles que você chama se tiver que “se livrar de um corpo” (notem o nível), eram só o Cícero e a Vívian, que hoje consideramos até família.
Marido viajava muito. Eu e Theo ficávamos mais sozinhos ainda. Eu só pensava “e se eu adoecer tendo que cuidar de casa/roupa/comida/cachorro/Theo? Quem vai me socorrer??”. Afinal, a Vivian tinha um bebê pequeno e não poderia deixá-lo se eu chamasse – ou mesmo levá-lo e arriscar que ele pegasse uma virose ou coisa parecida.
Meu primeiro livro foi lançado em julho e foi um sucesso (graças a vocês!). Descobri aí uma nova carreira, me encontrei profissionalmente. Gerenciar todos os desdobramentos disso – como palestras, outros livros, pupaniques e afins – morando tão longe seria muito difícil.
Por fim, meus pais estão envelhecendo. Os do meu marido também. (Todos nós estamos…). E as despedidas estavam ficando mais difíceis. Comecei a questionar se era justo com eles manter o Theo tão longe. E se era justo com o Theo privá-lo do convívio tão amado com os avós.
Sim, o Brasil tem inúmeros problemas, mas tem afeto. Tem família, tem amigos, vida social, tem muitos profissionais bons no meio do autismo. Cada caso é um caso. Conheço um monte de gente que se adapta perfeitamente à vida lá fora, gerencia bem as saudades e não quer voltar. Respeito e entendo! Mas, para nós, não dava mais.
Volta ao Brasil e surpresas
Theo é meu ídolo. Amo até o infinito! Ele surpreende a todos diariamente. Reagiu super bem à mudança e às saudades do pai, que só veio agora. Já está totalmente adaptado à vida aqui. Meu maior receio, que era o de não achar uma escola boa que o acolhesse, foi pro ralo. Achamos uma escola regular pequena que o recebeu de braços abertos. Ele está feliz, aprendendo em seu ritmo, e já tem até amiguinhos, mesmo sem falar! Muitas vezes, quando chegamos para buscá-lo, ele chora por ter que deixar os amigos e ir pra casa! Atualmente, Theo tem a agenda cheia:
Temos uma terapeuta ocupacional que vem uma vez por semana ajudar com as atividades de vida diárias (vou postar mais sobre isso depois);
Temos uma psicóloga que vem 3 vezes por semana treinar fundamentos de fala, principalmente imitação vocal e contato visual, usando ABA;
Ele também faz Integração Sensorial uma vez por semana;
Faz um trabalho sensacional de motricidade oral com a fono. Eu não imaginava que falar era algo tão complexo assim! Vários músculos importantes para a fala estão meio adormecidos pela falta de uso, e a fono trabalha para deixar esta parte ok, pronta para o uso!
Além disso, faz natação duas vezes por semana.
A vida social do nosso mocinho também vai de vento em popa! Todo fim de semana é um amiguinho novo ou um evento legal pra ir! Ele não contém a alegria, afinal, não conseguiu fazer nenhum amiguinho na Suécia.
A video posted by Blog Materno | Andrea Werner (@lagartavirapupa) on Oct 5, 2016 at 8:59am PDT
Aqueles vídeos curtinhos que a terapeuta te manda e que valem tanto! A fala, o olhar…já apertei ele taaaanto depois de ver isso!!! ?????? #theolindo #theoesperto #orgulhodamamae A video posted by Blog Materno | Andrea Werner (@lagartavirapupa) on Oct 21, 2016 at 4:05am PDT
A video posted by Blog Materno | Andrea Werner (@lagartavirapupa) on Oct 28, 2016 at 3:42am PDT
Já temos algumas palavrinhas faladas por aqui. Além do “mamã”, agora já sai também “papá”, “tchau”, “aba” (pra água) e algumas sílabas como “ba” e até um “xi”. Post enorme, mas achei que vocês gostariam de ouvir um pouco sobre como essa mudança foi positiva pra nós e pro Theo!
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