“Quando as expectativas de alguém são reduzidas a zero, essa pessoa realmente aprecia tudo o que ela tem” ~Stephen Hawking
Post difícil, mas necessário, sobre o nosso processo com o diagnóstico de autismo. Não tem como falarmos de certas coisas sem trazer tudo à memória novamente. Vou tentar resumir, brevemente, o mais longo mês da minha vida: maio de 2010.
Theo já tinha frequentado uma escolinha antes, quando fez 1 aninho, mas ficou por pouquíssimo tempo, porque logo veio a gripe suína e todo aquele pânico das mães de crianças pequenas. Tínhamos mudado de apartamento no início do ano de 2010, em fevereiro. Logo, matriculamos o Theo na nova escola. Era uma escolinha bilíngue muito boa, quase na porta de casa.
No final do mês de Abril, eu e Leandro viajamos em uma segunda lua-de-mel. Meus pais vieram de Belo Horizonte pra São Paulo para ficar com o Theo, pra que ele mudasse sua rotina o mínimo possível e pudesse continuar indo à escola.
Eu acredito, realmente, que o Leandro sentia que alguma coisa estava errada. Assim que chegamos dos 19 dias de viagem, ele ligou para a escolinha do Theo e marcou uma reunião para saber como foi o primeiro mês “acadêmico” dele. E foi, sozinho, conversar com as professoras do Theo um dia depois.
Eu estava no trabalho quando ele me ligou. Parecia muito preocupado e disse que as professoras do Theo tinham apontado algumas coisas realmente graves no relatório dele. Pedi pra que ele lesse o relatório. E aí estava:
Relatório da escola do Theo
O momento em que a “ficha cai” é o mais doloroso possível. Eu não precisava jogar no Google pra entender o que o relatório sugeria, apesar de eu não saber quase nada de autismo. Saí correndo do trabalho imediatamente e aos prantos.
Pediatras e afins
Em um primeiro momento, decidimos não comentar com ninguém e corremos para a pediatra do Theo, que nos encaixou no mesmo dia. Ela leu o relatório, pareceu perplexa e afirmou categórica: “Não, seu filho não é autista! Pode ficar despreocupada! Tenho uma paciente autista da idade dele. Ela chega aqui, no consultório, senta no cantinho e fica balançando. O Theo não faz isso. Ele é esperto, explora o ambiente, procura brinquedos, interage com vocês”.
Em seguida, ela perguntou: “Ele fica muito tempo na tv? No dvd?”. Respondemos, meio sem jeito, que sim. Daí, até explicar que “focinho de porco não é tomada” e que o dvd era consequência (dele não gostar de absolutamente nenhum brinquedo) e não causa, já era. Ela encerrou dizendo que o que ele tinha, provavelmente, era falta de estímulo (leia-se: vocês, pais, não estimulam o menino devidamente). E recomendou um exame de audiometria para saber se ele não respondia porque era surdo.
Saímos de lá sem sinal de diagnóstico e sem chão. Não sei quem estava mais incomodado. Minha ficha tinha caído! Não adiantava a médica dizer que não tinha nada de errado com o meu filho! Agora, eu sabia que tinha!
Resolvi abrir o coração para a minha irmã e amiga, Luciana. Falei que a escola tinha umas desconfianças, tentei disfarçar. A resposta dela foi: “meu amor, acho que isso não vai ser supresa pra ninguém da família”. Parece que todo mundo já desconfiava de alguma coisa, mas não tinha coragem de falar.
Descobrimos que, no período em que estávamos fora, meu sogro levou o Theo em um pediatra muito famoso, especialista em comportamento infantil, que tem livros escritos e cobra uma fortuna pela consulta. O diagnóstico do pediatra: falta de estímulo. Mais uma vez, culpa dos pais que não estimularam a criança direito. Nada de autismo.
A peregrinação…curta, ainda bem
Eu prefiro acreditar que a maioria dos pais não cai no papo dos pediatras, assim como nós não caímos. Acho que, acima de tudo, nem eu nem Leandro somos do tipo de perfil que entra em negação.
A ficha tinha, mesmo, caído, e bem pesada. Resolvemos procurar profissionais focados nesse tipo de transtorno e fomos parar no consultório de um psiquiatra infantil muito famoso (e caro) em São Paulo atrás de um diagnóstico.
Este senhor olhou o Theo por 5 minutos e já largou a bomba: “Não quero rotular o menino. O único rótulo que ele vai ter na vida é o nome dele. Blablablabla”. E nós, tentando entender melhor: “mas doutor, o senhor está dizendo que ele é autista?”. “Veja bem, não gosto de rótulos…”. SIM, ele estava dizendo que o Theo era autista, mas tudo isso sem dizer a palavra.
O psiquiatra nos indicou um tratamento com fonoaudióloga, massagens, mas tudo bem na linha alternativa. E já emendou: “vocês vão fazer a peregrinação, não é?! Eu sei que vão (e fez cara de tédio). Então, eu já digo pra vocês aonde ir”. E começou a listar vários médicos em São Paulo e outras capitais.
Leandro incomodado…eu incomodada. Não curtimos o cara. Ele não explicou praticamente nada. Só nos largou com um rojão na mão. Resolvemos ir atrás de um dos médicos que ele tinha citado, um neuropediatra de São Paulo.
Pesquisando no Google, descobri que ele era referência em autismo, tinha livros escritos a respeito e vários artigos publicados. E lá fomos nós.
O médico pediu para o Theo entrar na sala e fez vários testes com ele. Deu carrinho pra ele brincar… ele virou de cabeça pra baixo e ficou mexendo nas rodinhas. Chamou o Theo várias vezes pelo nome, e ele não olhou nenhuma vez. Mostrou brinquedos, fez barulhos, ligou uma lanterna…depois de uma meia hora, pediu pra o Theo sair para a sala de espera e nos deu o diagnóstico.
Transtorno Global do Desenvolvimento
– “Seu filho se enquadra no que chamamos de Transtorno Global de Desenvolvimento”.
Parecia que a cadeira tinha sumido debaixo de mim e que eu caía em um buraco enorme, sem fim.
E continuou:
– “Seu filho não fala”
– “Como assim, doutor?! Ele fala, sim! O senhor, mesmo, viu ele cantando a musiquinha!”
– “Ele te chama? Chama ‘mamãe’? Ele te pede água?”
– “Não, doutor…ele não faz isso”.
– “Ele dá tchau? Bate palminhas?”
– “Ele fazia isso, mas parou de fazer…”
– “Ele aponta para as coisas demonstrando interesse?”
– “Não…” (e não, não, vários “nãos”)
Ele foi bem didático: explicou que autismo é um transtorno global do desenvolvimento que afeta a parte da comunicação, da socialização e do comportamento da criança. E que, como o Theo ainda era muito novinho, não dava pra fechar exatamente o diagnóstico (de qual tipo de autismo estávamos falando). Mas que ele já descartaria autismo clássico, já que o Theo era esperto, aparentava inteligência normal, era afetuoso e, de certa forma, interativo. Ele poderia ser um caso de Síndrome de Asperger ou de TID-SOE (transtorno invasivo do desenvolvimento sem outra especificação). Este último é o diagnóstico da criança que, basicamente, não tem todas as características para ser encaixada como Asperger ou como autista clássico. (Hoje, sabemos que ele se enganou: Theo é mesmo autista clássico.)
“E tem mais”, completou ele. “Autismo é genético. Portanto, NADA de culpa aí!”. Pensei na hora “obrigada, doutor! A gente realmente precisava ouvir isso!”
Daí, vieram as perguntas dos pais aflitos, chorosos e desgostosos do outro lado da mesa: “meu filho vai falar? Ele vai ser independente? O que posso esperar do futuro dele?”. E ele deu a única resposta possível: “Não sei. Não posso te prometer nada disso. Só posso dizer que o prognóstico dele é muito bom, porque não é dos casos mais graves e porque foi diagnosticado muito cedo para os padrões brasileiros. Vamos começar já a intervenção”.
E nos passou o telefone de uma fonoaudióloga focada em autismo…que, mais tarde, nos indicou uma terapeuta comportamental, especializada em análise do comportamento aplicada (ABA). Em menos de um mês após o diagnóstico, Theo já estava sendo tratado de forma apropriada.
Expectativas
Nenhuma mãe, no mundo, engravida pensando em ter um filho especial. Essa possibilidade nunca é cogitada, na maioria dos casos.
Lembro de quando estávamos “grávidos” do Theo. Quantos planos!! Ele vai estudar em tal colégio, vai fazer intercâmbio quando for adolescente, vai isso, vai aquilo…
Quando você recebe uma notícia como esta – do autismo -, é como se aquele bebezinho que você idealizou tivesse morrido. É um luto muito sofrido. A aceitação é muito, muito difícil.
Mas você tem, aí, um novo bebezinho, meio desconhecido pra você, é verdade. Mas que também vai te dar muitas alegrias. E que não quer estudar na escola X ou fazer intercâmbio: tudo o que ele quer é ser feliz, ser amado e ser aceito.
E é esse novo bebê que eu tenho abraçado todos os dias. Tento viver, agora, com o mínimo de expectativas. Um dia após o outro. Cada conquista pequena dele é uma imensa alegria!
Ainda estamos nos conhecendo, é verdade. Passamos por vários momentos difíceis todos os dias. Mas amo ele mais que tudo. E vou fazer todo o possível pra que ele se desenvolva, alcance todo o seu potencial e possa ser…FELIZ!
Meu molequinho
Para uma lista dos sinais de autismo por idade, clique AQUI.
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