Lembro-me bem da primeira reunião com a fono do Theo. Ele não era muito mais do que um bebê, com quase dois anos de idade, suas perninhas rechonchudas, e um diagnóstico de autismo recém saído da mesa do neuro.
Perguntei a ela: “ele vai falar?”. E a resposta foi tudo, menos o que eu queria ouvir: “não posso garantir nada”. Como assim, não pode garantir? Mas você não é fono? Não vai fazer ele falar?
No nosso desespero pós diagnóstico, superestimamos a capacidade de alguns profissionais. Não é culpa deles e nem nossa, mas é fato que acontece. Recebo emails de mães desesperadas falando “meu filho faz fono há 3 meses e ainda não fala”. Semana passada, recebi um em que a mãe dizia “já foram duas sessões e não vi resultados”. Fico até meio sem jeito de responder, mas o que percebi no autismo, nos nossos 5 anos de diagnóstico, é que o desenvolvimento não é previsível, e muito menos linear.
Theo teve um pico de desenvolvimento nos seis meses posteriores ao diagnóstico. Começou a atender a comandos verbais (antes, agia como se fosse surdo), a perceber melhor o mundo ao redor, a verbalizar mais. Mas, entre os 3 e 4 anos, regrediu um bocado. O resto das verbalizações sumiu e vieram os comportamentos restritos e repetitivos. Falei disso nesse post aqui. A partir de então, o desenvolvimento dele tem sido no ritmo “devagar e sempre”.
Theo tinha sido diagnosticado com “autismo leve”. Mas o desenvolvimento posterior não comprovou isso.
A verdade é que nenhum médico pode olhar para uma criança de 2 anos, ainda meio bebê, e dizer que é autista leve. O que vai determinar se é leve ou não é como ela vai se desenvolver até os 5 anos. Quando você olha um bebê de menos de dois anos ao lado de seus pares da mesma idade, acha mais similaridades que diferenças. Quando as crianças já têm 5 ou 6 anos, aí você percebe o gap com mais clareza.
Questionamentos
“Doutor, meu filho vai ser independente”? A esta pergunta de uma mãe ou pai, segue-se o olhar condescendente do médico e a resposta “não temos como saber”. O médico tem razão…
O autismo ainda é cheio de mistérios e eu já vi de tudo nesses 5 anos: desde crianças que faziam só ABA e fono 2 vezes por semana e praticamente perderam todos os sintomas de autismo até crianças que faziam dieta, biomédico, terapia ocupacional, fono e mais um punhado de coisas e continuam com graves comprometimentos.
E a gente fica no meio desse tiroteio sem saber o que funciona de verdade. O principal motivo é que pouca gente faz “só uma coisa”. A maioria das crianças está com intervenções múltiplas. Como saber a abordagem campeã?
Outra coisa que notei é que não há um consenso: algumas abordagens são ótimas pra uns, mas não funcionam tão bem em outros. É por isso que se diz por aí que não temos “o autismo”, mas “os autismos”. Achar a combinação certa que funciona para cada criança é um trabalho de mãe-detetive.
Pra onde correr?
Independente do diagnóstico, é sempre importante organizar a base, que é o corpo. Muitas crianças autistas têm falta de tônus muscular e problemas sensoriais e motores que vão, sem dúvidas, atrapalhar o aprendizado. Foque aí, se for o caso, e procure uma fisioterapeuta ou uma terapeuta ocupacional.
Quando à parte orgânica, é legal fazer um checkup completo de alergias alimentares, hormônios, ver se está tudo em ordem. Tenho visto muitas crianças autistas com o organismo desestruturado, o intestino desregulado, e isso, com certeza, influencia no comportamento e nos progressos.
A fono é importante, mas devemos perder um pouco o conceito de que ela “vai fazer a criança falar”. Não necessariamente. Algumas crianças com autismo têm comorbidades que impedem a fala. Se esse for o caso do seu filho, que a fono consiga auxiliá-lo a se comunicar de alguma forma.
Quanto ao ABA, ao Son Rise, ao Modelo Denver, e todos os que influenciam diretamente no desenvolvimento cognitivo, informe-se e siga o seu feeling. Cada criança se adapta melhor a uma metodologia. Mas o importante é ver que ela goste do terapeuta e se conecte com ele. Só assim ela vai ter a motivação para aprender.
A pergunta de um milhão
Para mim, a pergunta de um milhão de dólares é “o quanto meu filho vai se desenvolver?”. E ela vale isso tudo porque ninguém, ainda, é capaz de responder.
Existe um mistério chamado “neurologia de cada um” que influencia naquilo que eu falei lá atrás: algumas crianças fazem pouco e se desenvolvem, enquanto outras fazem muito e não alcançam tanto.
Cabe a nós, pais, continuar tentando e acreditando.
E, aqui, vai um outro ponto de vista sobre as crianças que recebem muita intervenção e não se desenvolvem tanto assim. Minha amiga Fausta Cristina, do blog Mundo da Milena, desconfiou de algo quando a Mi tinha apenas 4 meses. Obviamente todos os médicos acharam que ela estava maluca, mas ela correu atrás e começou a estimular a Mi desde essa época. Hoje em dia, já uma adolescente, Milena fala, tem alguma independência, mas não pode ser considerada uma autista leve. E o que a Cris diz sobre isso? “Imagina se ela não fizesse as intervenções desde os 4 meses!”.
A gente não sabe até onde eles vão, mas vamos continuar tentando mesmo assim! Nada como a sensação do dever cumprido e de que fizemos tudo o que estava ao nosso alcance!
Imagem: Shutterstock
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